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Além do Ponto Final

Além do Ponto Final

Sab | 13.02.21

The Invisible Life of Addie LaRue, de V. E. Schwab

Estou a participar num desafio de um perfil que gosto muito no Instagram (@book.vorfreude), que consiste em ler os vencedores e runner-ups do Goodreads Choice Awards (também já li Such a Fun Age neste desafio, e vou ler mais uns), e foi nesse âmbito que decidi ler este livro. Já o tinha visto muito por esta comunidade livrólica, e admito que estava muito curiosa, mas entrei sem saber mesmo nada sobre a história, como gosto de fazer. Fui sem expectativas e posso dizer que este livro não me desiludiu, antes pelo contrário, gostei muito dele!

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Não sei muito bem o que dizer deste livro sem entrar em spoilers, mas Addie é uma jovem de 23 anos, que vive numa pequena vila francesa, em 1714. Desde pequena que teme a vida que vai ter, devido à sua condição de mulher no século XVIII e, por isso, acaba por fazer um pacto com a escuridão, onde troca a sua alma pela imortalidade e por uma vida de liberdade. Claro que há sempre um preço a pagar nestes pactos e, no caso de Addie, é a lembrança: Addie vai viver no esquecimento, tudo sobre ela se vai apagar da memória das pessoas no momento em que lhe virarem costas. Vamos então conhecendo como foi a vida de Addie, desde que foi amaldiçoada, até 300 anos depois, quando já é mais madura e conhece bem os contornos do pacto que fez. Não vou desenvolver muito mais sobre o livro porque tenho medo de estragar a sua essência, mas saibam que esta é uma boa história para entrarem nela sem saberem nada!

How do you walk to the end of the world? she once asked. And when Addie didn’t know, the old woman smiled that wrinkled grin, and answered. One step at a time

Este livro foi uma agradável surpresa. É uma verdadeira homenagem à vida e à alegria das pequenas coisas. A forma como Addie arranja forma de viver com a sua maldição e criar uma vida quase “normal”, mesmo sendo esquecida por toda a gente é comovente. Uma das coisas que achei muito interessantes ao longo do livro foi uma reflexão sobre o facto de as ideias serem mais fortes e livres que a memória e o modo como Addie se agarra a este princípio para começar a influenciar a arte das pessoas que conhece, de forma a ser lembrada de alguma forma, é muito bonita e deixa-nos rendidos à personalidade forte desta rapariga.

What she needs are stories. Stories are a way to preserve one’s self. To be remembered. And to forget.

But ideas are so much wilder than memories, so much faster to take root.

Outra coisa que gostei mesmo muito neste livro foi o desenvolvimento das personagens. Luc, o nome que Addie dá à escuridão, é uma personagem muito interessante e com muitas mudanças ao longo da história, o que faz com que cada momento seja uma surpresa. Nunca sabemos bem o que pensar em relação a ele, o que acrescenta muito ao desenvolvimento da narrativa. E Addie foi uma personagem pela qual desenvolvi um grande carinho e acabei o livro a sentir-me orgulhosa por tudo o que ela construiu e pela rapariga aliciante e forte em que se tornou.

Resta-me dizer, caso ainda não tenham percebido, que gostei muito deste livro e que recomendo a 100% a sua leitura. Uma história que nos mostra a beleza do mundo aos olhos de uma rapariga que está cá há 300 anos e continua a entusiasmar-se com as pequenas coisas. E se ela consegue, porque não havemos nós de conseguir? 😊

                   

Avaliação: 8,5/10

Ter | 09.02.21

Mataram a Cotovia, de Harper Lee

Mais um clássico que posso riscar da lista dos que quero ler pelo menos uma vez na vida! Este já andava cá por casa há imenso tempo. Finalmente peguei nele e estou feliz por o ter feito. Não vou dizer que adorei, mas acredito que isso tenha mais a ver com uma gestão de expectativas do que propriamente com o livro em si. Apesar de tudo, no geral, foi uma boa leitura!

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Mataram a Cotovia conta-nos a história da família Finch, constituída por Atticus, o pai, Scout, a filha, e Jem, o seu irmão. Scout tem 6 anos e vai ser do seu ponto de vista que vamos ver todos os acontecimentos do livro. A família Finch vive em Maycomb, uma pequena cidade imaginária do Alabama onde tudo parece pacato, até Atticus aceitar defender um habitante negro da cidade, Tom Robinson, que é acusado de violar uma mulher branca. É à volta deste acontecimento que o livro se vai desenvolver e vamos vendo o que Scout e o irmão sofrem devido a esta decisão do pai, atendendo a que vivem numa comunidade altamente racista e com pessoas muito preconceituosas.

Além da trama que envolve este caso, são abordados outros temas, pela visão inocente de uma criança, que nos fala da sua educação, ou do seu vizinho misterioso ou das “fofoquices” do bairro.

Coragem é sabermos que estamos vencidos à partida, mas recomeçar na mesma e avançar incondicionalmente até ao fim. Raramente se ganha, mas às vezes conseguimos

O único ponto menos positivo que tenho a apontar sobre esta leitura foi o facto de ter demorado muito tempo a entrar na história, diria que apenas a meio do livro. Isso acabou por fazer com que não conseguisse desfrutar do resto da leitura, que achei muito melhor, porque me sentia “cansada” da leitura que tinha feito até ali.

Tirando esse pormenor, acho que é um livro muito bom e percebo o porquê de ser um livro de leitura obrigatória nos EUA. Mataram a Cotovia é uma história sobre racismo, sobre preconceito, sobre classes, sobre justiça, sobre tanta coisa. E o facto de vermos tudo pelo olhar inocente de uma criança, que tenta decifrar tudo o que vê à sua volta e perceber injustiças que não são possíveis de perceber, torna este livro mágico. Outro ponto que gostei muito, foi ver como Atticus tenta educar os seus filhos de forma a que eles reflitam sobre o que acontece à sua volta, em vez de caírem na ignorância ou em preconceitos.

Jem, como é possível odiar tanto o Hitler e, assim que se voltam as costas, ser-se tão mau para as pessoas da nossa terra...

(...) o pressuposto malévolo... De que todos os negros mentem, todos os negros são seres imorais e todos os homens negros são perigosos para as nossas mulheres (...)
E esse pressuposto, senhores, sabemos não passar de uma mentira tão negra como a cor da pele do Tom Robinson, uma mentira que não preciso de vos demonstrar. Os senhores sabem a verdade e a verdade é só esta: alguns negros mentem, alguns negros são imorais e alguns homens negros são perigosos para as mulheres... Brancas ou negras. Mas esta verdade aplica-se à raça humana e não a uma raça específica

O livro tem, ainda, muitas metáforas (admito que não as apanhei todas), sendo o próprio título a maior delas. Eventualmente na história, dizem a Scout que pode matar os corvos que quiser, mas que nunca deve matar uma cotovia, porque elas são inocentes. O título Mataram a Cotovia vai referir-se, assim, à morte da justiça ou da inocência, que vemos ao longo de toda a história através do racismo existente, ou do próprio crescimento de Jem e Scout. Não me apercebi disto a ler, mas, quando pesquisei sobre o livro e encontrei esta informação, tudo fez tanto sentido!

Para concluir, Mataram a Cotovia foi uma boa leitura, daquelas que se gosta mais quando se acaba e se pensa na história do que durante a própria leitura, pelo menos para mim. Aconselho muito porque acho que é daqueles livros que toda a gente devia ler, pelo menos, uma vez na vida! 😊

              

Avaliação: 7,5/10

Sex | 05.02.21

Uma Educação, de Tara Westover

Uma Educação era um livro que estava há imenso tempo na minha lista de livros a ler. Andava sempre a passar outros livros à frente, mas como o recebi como prenda de Natal, agora que o tinha fisicamente, não havia forma de continuar a adiar. E ainda bem porque esta foi uma leitura incrível! Tinha medo que, como as minhas expectativas estavam muito altas, acabasse por me desiludir, mas isso não aconteceu, nem de perto.

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Uma Educação é um livro de memórias de Tara Westover, que nasceu no Idaho em 1985. Tara e os seus irmãos vivem no seio de uma família Mórmon e não frequentam a escola, nem vão a médicos. O seu pai é fanático e acredita no Fim dos Tempos, de modo que toda a família vive a preparar-se para eles e a tentar ser completamente autossuficiente e independente do Governo. Tara só obtém uma Certidão de Nascimento aos 9 anos e só pisa uma escola pela primeira vez aos 16 anos. É, aliás, esta decisão de ir para a faculdade que acaba por mudar para sempre a relação que tem com os pais e que vai ser o centro da narrativa.

Em adulto, o pai viria a desenvolver opiniões ferozes sobre o facto de as mulheres trabalharem, sendo consideradas radicais até na nossa comunidade mórmon rural. "O lugar de uma mulher é em casa", dizia sempre que via uma mulher casada a trabalhar na cidade

Enquanto escrevo isto continuo sem saber muito bem como descrever este livro porque há tanta coisa a dizer sobre ele. Está dividido em 3 partes e diria que a primeira, sobre a infância de Tara, é a mais chocante de todas. Confrontamo-nos com situações que, para o que é considerado “normal” na nossa sociedade, são completamente impensáveis, tais como uma menina de 9 anos trabalhar numa sucata horas e horas por dia, correndo risco de vida várias vezes, ou alguém ficar gravemente ferido e ser tratado apenas com óleos medicinais, sem nunca ir a um médico, porque isso contraria a vontade de Deus. Chega a ser revoltante ver como Tara acha que estes acontecimentos e maus tratos que sofre são absolutamente normais.

Uma coisa que achei absolutamente incrível, foi a forma como a escrita de Tara é bonita e como ela fala da família de uma forma empática. Esta jovem mulher sofre maus tratos físicos e psicológicos por parte do irmão e, a partir do momento em que decide ir para a faculdade, sofre muito de problemas mentais provocados pela forma como o pai e a mãe se opõem à sua necessidade de ter uma Educação. Mesmo assim, Tara fala de toda a família de forma a tentar justificar e mostrar a lógica por trás dos seus atos, sem os julgar. Outra coisa me marcou muito ao longo do livro foi ver a evolução que há na forma como Tara vê o mundo e como o interpreta. E mesmo a evolução intelectual é muito interessante de se ver porque esta jovem, que nunca foi à escola, consegue entrar na Universidade e acaba doutorada pela Universidade de Harvard. Que mulher e que força de vontade!

A t-shirt chegava-me quase até aos joelhos, mas ainda assim estava com vergonha de ver tanto das minhas pernas. O pai dizia que uma mulher decente nunca mostrava nada acima do tornozelo

Desde que compreendera que o meu irmão Richard era um rapaz e eu era uma rapariga, quisera trocar o futuro dele pelo meu. O meu futuro era a maternidade, o dele a paternidade. Pareciam idênticos, mas não eram. Ser um deles, era tomar decisões. Presidir. Impor ordem na família. Ser o outro, era estar entre os que se submetiam

Não quero dizer muito mais sobre Uma Educação porque acho que é daqueles livros que toda a gente devia ler. Faz-nos pensar muito sobre o que é Uma Educação, sobre a influência que essa educação tem em nós e sobre a forma como as pessoas que amamos acabam por moldar muito a nossa visão do mundo. Sinto que nada do que escrever aqui vai fazer jus ao livro, por isso leiam, prometo que vale a pena!

                 

Avaliação: 9/10